"É a vida, mais que a morte, a que não tem limites."

segunda-feira, 19 de julho de 2010

ALENTO

Minha vida sempre teve trilha sonora. Nunca ouço música impunemente.

Uma de minhas lembranças mais remotas é de parar de brincar para ouvir música. Criança estranha, gostava de Frank Sinatra, de Bossa Nova. A "Cavalgada das Valquírias" abastecia-me de entusiasmo. "João e Maria" traduzia meu faz de conta.

Fugindo ao clichê, no entanto, nem todos os meus amores tiveram a "nossa" música. Alguns foram cheiro, perfume. Outros, uma determinada hora do dia, ou tato, ou sons outros que não notas musicais. Há um quase-amor, esmaecido, que virou uma canção na luz de fim de tarde de um verão. E o maior de todos tem toda uma trilha sonora, que cresce ainda hoje.

Quando meu tio, irmão mais novo do meu pai, morreu de forma trágica, eu tinha cinco anos e fui, como as outras crianças, "protegida" da verdade, o que não evitou a dor. Confusa, mantida à distância, lembro-me do meu pai chorando e ouvindo música com fone de ouvido. Essa dor foi surda.


Também dói-me a música quando vai além dos sentidos para transformar-se em sentir. Porém, me arrebata, me toma inteira, me alegra, quando me faz acreditar. Serendipity.

Hoje vi minha menina puxar o canto na capoeira. Desafinada como a mãe. Para ela, ainda bebê, fiz uma cançao de ninar. Já coloquei a letra aqui no início do blog, mas hoje tenho a coragem de mostrar que canto para ela, que é todos os sons e todas as notas.



(Fiz esse vídeo alguns dias depois do seu primeiro aniversário. Hoje ela tem seis anos, e é ainda mais bela...)

13 comentários:

Heloísa Sérvulo da Cunha disse...

Nina,
Que nenê mais lindo.
E que música mais singela!
Com certeza sua filhinha representa, para você, todos os sons e todas as melodias.
Beijos.

Ana Rosa disse...

Eu tenho tantas músicas que me fazem lembrar de momentos da minha vida. Isso faz parte de estar vivo.

Anônimo disse...

Bonito texto. E você, que música seria? E que música eu lhe daria?
Beijo

3 x Trinta - Solteira, Casada, Divorciada disse...

Coisa mais bonitinha!!! Adorei.

Beijão,

Bela - A Divorciada

Carla disse...

Que texto tão sensível!
Que bebê mais linda, obrigada por mostrá-la a nós!

beijo, querida!
Carla

Dani Maciel disse...

Nina! quanta doçura!

Nina disse...

Helô,

Obrigada!
Ai, minha fifi era muito linda mesmo... É!! (coruja total, eu sou...)

bjo


Ana,

Sim, estamos sempre construindo nossa trilha sonora, não é?

bjo

Nina disse...

Anônimo,

Como disse no post anterior, sou tantas canções...

bjo

Bela,

Obrigada!

beijão pra vc também!

Nina disse...

Carla,

Obrigada pelos elogios, ao texto e a minha filha... Essa, aliás, é linda mesmo...:p

bjo

Dani,

Obrigada!

bjo

Roberto Marinho Guimarães disse...

Nina,

Há quem tenha memórias tão remotas quanto a sua vida intra-uterina, como óvulos ou espermatozóides e, até mesmo, de vidas passadas.

Não sei se admiro ou se tenho medo desse tipo de gente!

Diria que minhas lembranças remotas são bem recentes, daí o meu espanto diante de quem jura ter assistido ao próprio parto ou coisa anterior.

Tenho uma recordação especial de minha infância que me é muito, muito querida e diz muito de mim.

Recordo-me, como se fosse há 15 minutos, que minha mãe me ninava cantando. Chego a ve-la, de bruços, me fazendo carinhos que só mães são capazes e, cantando.

Não sei se era afinada ou não, sei, somente, que o seu timbre me acalmava, aconchegava, me conduzia de volta ao preciso ventre, onde eu estivera protegido de tudo e de todos.

É a recordação mais remota que tenho de minha vida e, confesso, não sei se é uma recordação ou reprodução do que devo ter ouvido ainda criança.

O que importa é que esta cena é real e forte em minha memória. Vejo-me bebê e minha mãe a cantar, entre aconchegos maternos.

A essa altura, imagino a moça grande, de cachos, de mãos postas a indagar: - E daí! o que esse cara quer dizer com essa ladainha?

Antes que a moça crescida, de cachos, recuse o meu comentário, devo esclarecer a razão dessa longa e tediosa introduçào.

Assim como ela, música sempre fez parte de minha vida, e o primeiro episódio de sensibilidade à música se deu com a minha mãe cantando para me ninar.

A verdade é que ela cantava e eu me deliciava até que ela ameaçasse cantar "tristeza não tem fim... felicidade, sim". Bastava isso para que eu me descontrolasse em choro profundo e sentido.

Segundo me lembro ou me contaram, a experiência foi repetida e com os mesmos resultados. Reagia mal a essa música, como reajo até hoje. Não gosto de ouvi-la.

Deus, na distribuição dos talentos, infelizmente, não me deu o de compor, fazer ou tocar música. Reservou para mim o talento de ouvir e de aplaudir quem faz música.

Assim, sempre tive trilha sonora em minha vida. Parece bom, mas não é.

Quem se lembra do álbum de j. Lennon, lançado às vesperas de seu assassinato? Pois é... é um lindo álbum que não consigo mais ouvir, seja pelo que aconteceu a ele, seja pelo fato de ter coincidido com a morte de minha mãe, aquela que me ninava e mimava cantando.

Por outro lado, verdadeiras agressões à arte da música me são caras porque me remetem a situações da puberdade, inesquecíveis.

Podem rir, mas, até hoje, ouvir loving you (com passarinhos e tudo) me arrepia. Serendipity!

Por outro lado, tristeza ou Pedaço de Mim, na voz de Zizi Possi, me fazem chorar em qualquer momento, situação ou circunstância.

Pedaço de Mim é algo que não ouso arriscar explicar, ou tentar compreender, apenas sinto, e sinto cada verso, cada frase, telvez, pela saudade da metade de mim que jamais conheci.

Por fim, há músicas que tomamos como nossas, que não tem relação com fato algum, apenas tocam o nosso sentir.

RMG

Nina disse...

Que lindo seu comentário, Roberto!
Como tudo o que você escreve, aliás...
Tão bonito, e me comoveu tanto, que merece virar post...

beijo

mmartafilipa disse...

adorei :)
parabéns

Nina disse...

Marta Filipa,

Obrigada! Volte sempre!

Bjo

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