"É a vida, mais que a morte, a que não tem limites."

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Incêndio!

A gritaria me acordou. Olhei para o relógio: 3hs da manhã. No apartamento de cima, muito barulho.
Madrugada de sábado para domingo, moro próximo a um hotel onde frequentemente se hospedam adolescentes barulhentos. Pensei que era mais um caso de bagunça. Mas os gritos começaram a fazer sentido:

- Chama o bombeiro!
- Sai todo mundo, 'tá pegando fogo!
- Ah, vai morrer todo mundo!

Resolvi conferir, ainda sonolenta. Abri a janela do quarto, o cheiro de fumaça invadiu. O incêndio era real. E era no meu edifício.

Corri para sala, meu marido tinha aberto a porta da sacada, o cheiro de fumaça estava mais forte. Neste momento, parei de pensar. só agi. Minhas pernas tremeram. Corri para acordar minha menina, não medi as palavras:

- Filha, acorda! O prédio está pegando fogo e temos que descer.

Ela não perguntou nada. Não se assustou, nem achou que era brincadeira. Apenas estendeu os braços. Saímos os três de pijama. Só coloquei os sapatos e peguei a bolsa, ainda assim porque ela fica sempre ao lado da porta. Passei minha filha para o colo do pai. Alguns vizinhos também já estavam descendo pela escada de incêndio. Uma moça entrava no elevador com o cachorro:

- Por aí não, pode faltar luz e você ficar presa.

E descemos. O cheiro de fumaça cada vez mais forte. Minha menininha com o rosto escondido no ombro do pai, tentando não respirar a fumaça. Algumas vezes a luz falha. Finalmente, chegamos ao térreo. Muita gente lá.

O incêndio é no terceiro andar. Alguns moradores combatem o fogo com a mangueira do edifício. Os bombeiros chegam, logo tudo está controlado. Ninguém está machucado. Apenas uma moça chora muito, porque entrou em pânico e esqueceu o cachorro. Um toque tragicômico: em meio à fumaça que invadia o terceiro andar, desorientados, os bombeiros arrombaram a porta do apartamento errado. O dono está viajando.

Ficamos uma hora lá, esperando liberarem o edifício. Ainda há muita fumaça, mas o estrago é restrito à área de serviço do apartamento, onde o fogo começou, não se sabe ainda o porquê. Os moradores do apartamento estão calmos, passam por nós com algumas bolsas, vão passar a noite fora.

Voltamos para casa. Durmo de mãos dadas com a minha filha. Antes de dormir, ela fala:

- O importante é salvar as pessoas, né, mãe?

Sim, meu amor. Naqueles breves instantes antes de deixar minha casa, decidindo o que levar, eu sabia que tudo o que importava estava em meus braços:
Minha filha.

domingo, 28 de setembro de 2008

Aniversário

Dia desses, foi meu aniversário.
Meu e do meu pai, no mesmo dia.
Espero que eu tenha sido um bom presente para ele...

domingo, 21 de setembro de 2008

Viagem de trem - 2

(continuação do post anterior)
Dentro do trem, tudo é novidade! As máquinas fotográficas não param.

Atrás de mim, um homem filma tudo. Aliás, filmou sem parar a viagem inteira. Infelizmente, acho que ninguém irá aguentar ver o filme todo, longuíssimo...Chato!

Minha menina pula de banco em banco, ora conosco, ora com a teacher, ora com os amigos... Um conjunto regional entra e toca algumas músicas. Mas logo o balanço suave e o barulhinho ritmado começam a fazer efeito. Ela, que dorme no carro em qualquer passeio que dure mais que alguns minutos, começa a se encostar, os olhinhos lutam para ficarem abertos. Ela fala:

- Quanto mato, né, mamae?

E dorme.

Realmente, pela janela passam lindas paisagens verdes, meio encobertas pela neblina. Nem parece final de setembro! Está um dia típico de inverno e ao passarmos lentamente pela cidadezinha no mais alto da serra, parece que o trem nos levou para o passado, em outro país... Tudo está envolvido pela névoa branca, não há carros nas ruas e as poucas pessoas que passam estão com pesadas roupas de inverno. Enquanto o trem passa apitando, todas acenam e sorriem. Das casas, saem crianças com bochechas rosadas de frio, que pulam dando tchau!

O trem deixa a cidade e continua sua viagem por entre a natureza. Passamos por pontes e túneis.

Minha menina dorme...

Perto do meio-dia, chegamos à nossa parada para o almoço. Meio desorientada, minha filha acorda, olha em volta, sorri...

O almoço é em um salão comunitário, à sombra da torre de uma igrejinha. Bonito cenário. Mas a comida, bem ruinzinha, é o único ponto negativo do passeio.
Minha menina quer ir ao banheiro, a fila é enooooorme! Ela faz xixi no murinho e fica bem feliz por mais esta quebra de rotina. Quanta aventura!
O trem apita três vezes. Hora de voltar!
Desta vez minha menina vai bem acordada, aproveita as curvas e túneis, o amigo, a teacher. Os adultos se encantam alternadamente com a linda paisagem que corre pela janela e com as crianças dentro do trem.
Muitas pessoas estão à beira da estrada vendo o trem passar.
Adeus, adeus...
E logo chegamos, de volta ao ponto de partida... Todos felizes, com um brilho de infância no olhar.
A volta para casa é bonita e tranquila, em meio à neblina da estrada. Levamos a teacher para casa, minha menina quase chora...
Foi tudo tão bom! E o que vai ficar na lembrança da minha menina com certeza será terno. Talvez ela se lembre mais de a professora ter dormido em casa, de fazer xixi no muro, da rosca imensa... Mas misturada à estas lembranças, estará o balanço do trem.
E envolvendo tudo e todos, como a bruma, o amor.
(Para saber mais:

Viagem de trem - 1

Falei para minha menina que íamos passear em algo que ela nunca tinha "andado" antes. Pensando que ela iria acertar na hora e ficar muito feliz:
- Já sei, mãe! Vamos passear de helicóptero!
- Não, querida, de trem!
- Ah....

Pois é, o suspense acabou tirando um pouco da graça da surpresa. Eu não imaginei que avião e helicóptero fossem categorias diferentes...

Mas fomos ao nosso passeio de trem, e foi tão bom! Eu tenho as melhores lembranças desses passeios, na infância íamos sempre de Pindamonhangaba até Campos do Jordão. E ainda tive a sorte de fazer alguns passeios entre cidades em linhas regulares, que funcionavam paralelas aos ônibus e infelizmente se acabaram...
Foi tudo novidade para minha menina! Começou com a professora querida dormindo em casa, o que resultou em grande prestígio entre os amigos na escola. A teacher foi conosco, e como íamos sair cedo e ela mora longe, foi a solução mais prática. E também emocionante para minha filha! Deixamos a chave para ela na portaria (tivemos um compromisso) e um lindo desenho feito pela minha filha na porta do apartamento, antecipando a alegria do dia seguinte.
Quando chegamos em casa, a professora já dormia. Minha menininha olhava a porta do quarto com grandes olhos esperançosos... Mas soube esperar, e antes do sol nascer do dia seguinte, foi acordar nossa companheira de viagem. Que parecia tão feliz quanto ela!
A viagem foi longa até a cidade de destino. O sol nasceu lindo no horizonte sobre o mar, mas logo começou a chover fraco. Na subida da serra, as flores e as árvores mostravam-se ainda mais verdes e lindas e em certos momentos a neblina que descia me lembrava como eu gostava de procurar anjos quando dirigíamos nas nuvens.
Chegamos cedo. A velha estação ferroviária só nossa. Parecia triste, com tantos trens abandonados. Mas a Maria Fumaça do nosso passeio reluzia!
Minha menina, que dormiu a viagem inteira, estava com fome. Eu, ela, o pai e a professora fomos a pé até o centro da cidadezinha, lojas ainda abrindo, tomar café da manhã na padaria. Autorizada a pedir o que quisesse, escolheu uma rosca imensa, coberta de creme amarelinho. Não conseguiu chegar até o fim, mas o que não coube na barriguinha encheu por muito tempo seus olhos de felicidade!
De volta à estação, quanta gente! De todas as idades, de todos os lugares, em busca da delícia efêmera de um passeio de trem. Entre tantos, nos encontramos com o amiguinho de escola, uma prima e seus pais, como combinado. Ela e o amigo não se cansaram de mostrar tudo a teacher, orgulhosos da inversão de papéis.
O apito avisa: é hora de partir.
Os vagões mostram a idade, mas também beleza. Somos todos crianças nesta hora, unidos pela expectativa da partida.
Lentamente, o trem deixa a estação.
(continua no próximo post)

Ponta de Areia

Ponta de Areia



(Milton Nascimento & Fernando Brant)


Ponta de areia ponto final
Da Bahia-Minas estrada natural
Que ligava Minas ao porto do mar
Caminho de ferro mandaram arrancar
Velho maquinista com seu boné
Lembra do povo alegre que vinha cortejar
Maria fumaça não canta mais
Para moças flores janelas e quintais
Na praça vazia um grito um oi
Casas esquecidas viúvas nos portais

terça-feira, 16 de setembro de 2008

De cabelos e sonhos

Ainda não cortei os cabelos da minha menina.

Como ela nasceu carequinha, e tem só quatro anos, não são tão longos assim... E ainda guardam nas pontas a lembrança dos cachos dourados.

Ela está na fase de gostar muito de histórias de princesas e quer que os cabelos cresçam mais para ser "igual a Rapunzel". Mas eu quero diferente para você, minha filha! Quero que você tenha uma vida real, e não de contos de fadas.

Quero você uma mulher forte, independente e livre. Que seus horizontes sejam muito maiores do que uma torre. Que você mesma tenha a capacidade de resolver seus problemas, sem precisar de magia ou de um salvador. Que você encontre, um dia, um companheiro que siga ao seu lado, não à sua frente.

E acima de tudo, que você seja feliz todos os dias, e não apenas no final.


(este post foi inspirado por uma troca de e-mails com alguém que admiro muito)


Update: Cortei eu mesma os cabelos da minha menina pela primeira vez dia 09/10/2008. Quatro dedos de cabelo se foram. Bastante, para um serzinho de pouco mais de 1,15 m. E ela pela primeira vez sofreu a frustação, comum a todas as mulheres, de ninguém notar o novo corte!

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Lições

Hoje pela primeira vez não levei minha menina até a sala de aula. Fiquei no portão.
Não foi uma decisão antecipada, estávamos um pouco atrasadas e não quis entrar e atrapalhar, pois as crianças já haviam todas ido para a classe. Além do mais, eu não resisto a uma conversinha com a teacher... Então eu disse:
- Hoje você sobe sozinha, tá, filha?
E ela foi. Me deu um "grudinho de bico", um tchau desajeitado entre bolsas e o Urso, e foi.
Ao vê-la se afastar, feliz e autoconfiante, me deu uma tristeza... Uma vontade de tocar a campainha, entrar e seguir com minha filha.
Porque preciso dela para encontrar o meu caminho.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

... doce nome de filha

Eu já disse em outro post que minha infância tem a luz da casa dos meus avós paternos.
Minha menina de cachos tem o mesmo da minha avó materna. Elas nunca se encontraram... Mas eu conto para minha menina histórias da bisavó.
Minha avó era muito doce. Eu era um criança muito quieta e ela sempre me entendeu. Gostava de ficar em cima da cama no quarto dela enquanto era arrumado e ver a poeira dançando nos raios de sol. Estou nesta cama na minha foto preferida.
Ela me contava sobre sua infância e juventude, histórias que me encantavam. Filha mais nova de uma família bastante tradicional na cidade, suas roupas eram feitas por uma modista copiando figurinos que vinham de Paris (eu ainda tenho uma revista com estes figurinos). A casa dos meus avós era cheia de pequenos tesouros escondidos em armários e gavetas, xícaras chinesas delicadas como asas de borboletas, vidros de perfumes que cheiravam como um jardim inteiro, broches e enfeites vindos de lugares exóticos...
Minha avó era capaz de pequenos gestos cheios de significado. Cada neta tinha uma xícara especial para tomar café com leite e para cada uma ela fazia um bolo especial (meu irmão veio bem depois). Cozinhava divinamente. Também era muito bem humorada, gostava de contar piadas, adorava festas e estava sempre lendo, romances históricos que eu adorava ir comprar com ela no Mercado. Era muito sincera, para desgosto do meu avô, e histórias a respeito desta sinceridade fazem parte das lendas familiares.
Esta minha avó serena, que todos amavam, não teve uma vida fácil, no entanto. Perdeu dois filhos, um ainda criança, de sarampo. E outro, meu tio mais bonito e inteligente, morreu muito jovem em uma tragédia. Imagino que para ela e para meu avô a vida não tinha tantas cores quanto as que eles nos davam.
Ela tocou a vida de muita gente com sua delicadeza. Espero que minha menina seja, como ela, uma verdadeira dama.
(Minha outra avó tem nome de flor, mas é na verdade uma velha e bela árvore. Em sua sombra se abriga uma grande família, unida pela sua presença).

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Quando te vi, amei-te já muito antes

Eu queria muito ser mãe.
Mas parecia que não era para ser.
Porém, um dia eu sonhei com uma criança, linda, com cabelos claros cacheados. Vestida com um macacão jeans com detalhes coloridos.
No sonho, uma voz me disse:
- Este é o seu nenê.
Dias depois, descobri que estava grávida.
E quando minha menina tinha dois anos, era a imagem da criança do meu sonho.

"Quando te vi amei-te já muito antes
Tornei a achar-te quando te encontrei.
Nasci pra ti antes de haver o mundo.
Não há cousa feliz ou hora alegre
Que eu tenha tido pela vida fora,
Que o não fosse porque te previa,
Porque dormias nela tu futuro. "
(Fernando Pessoa)

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