Madrugada de sábado para domingo, moro próximo a um hotel onde frequentemente se hospedam adolescentes barulhentos. Pensei que era mais um caso de bagunça. Mas os gritos começaram a fazer sentido:
- Chama o bombeiro!
- Sai todo mundo, 'tá pegando fogo!
- Ah, vai morrer todo mundo!
Resolvi conferir, ainda sonolenta. Abri a janela do quarto, o cheiro de fumaça invadiu. O incêndio era real. E era no meu edifício.
Corri para sala, meu marido tinha aberto a porta da sacada, o cheiro de fumaça estava mais forte. Neste momento, parei de pensar. só agi. Minhas pernas tremeram. Corri para acordar minha menina, não medi as palavras:
- Filha, acorda! O prédio está pegando fogo e temos que descer.
Ela não perguntou nada. Não se assustou, nem achou que era brincadeira. Apenas estendeu os braços. Saímos os três de pijama. Só coloquei os sapatos e peguei a bolsa, ainda assim porque ela fica sempre ao lado da porta. Passei minha filha para o colo do pai. Alguns vizinhos também já estavam descendo pela escada de incêndio. Uma moça entrava no elevador com o cachorro:
- Por aí não, pode faltar luz e você ficar presa.
E descemos. O cheiro de fumaça cada vez mais forte. Minha menininha com o rosto escondido no ombro do pai, tentando não respirar a fumaça. Algumas vezes a luz falha. Finalmente, chegamos ao térreo. Muita gente lá.
O incêndio é no terceiro andar. Alguns moradores combatem o fogo com a mangueira do edifício. Os bombeiros chegam, logo tudo está controlado. Ninguém está machucado. Apenas uma moça chora muito, porque entrou em pânico e esqueceu o cachorro. Um toque tragicômico: em meio à fumaça que invadia o terceiro andar, desorientados, os bombeiros arrombaram a porta do apartamento errado. O dono está viajando.
Ficamos uma hora lá, esperando liberarem o edifício. Ainda há muita fumaça, mas o estrago é restrito à área de serviço do apartamento, onde o fogo começou, não se sabe ainda o porquê. Os moradores do apartamento estão calmos, passam por nós com algumas bolsas, vão passar a noite fora.
Voltamos para casa. Durmo de mãos dadas com a minha filha. Antes de dormir, ela fala:
- O importante é salvar as pessoas, né, mãe?
Sim, meu amor. Naqueles breves instantes antes de deixar minha casa, decidindo o que levar, eu sabia que tudo o que importava estava em meus braços: